Em memória de Dr. Manoel Bonfim
Ribeiro
Roberto Malvezzi (Gogó)
“Boi com sede bebe lama”, canta o forrozeiro
nordestino Flávio José. Verso apropriado aos dias que vivemos aqui no sertão.
Hoje, um pouco mais tristes, um pouco mais pobres, com o falecimento do Dr.
Manoel Bonfim Dias Ribeiro, um dos expoentes na luta por um semiárido digno,
particularmente a revitalização do São Francisco.
Ele foi por muitos anos um excelente técnico e
diretor do DENOCS e CODEVASF. Esse ano ainda puxou um encontro sobre a região
no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, reunindo especialistas das
universidades, órgãos governamentais e sociedade civil.
Dr. Manoel Bonfim tinha uma virtude admirável: a
autocrítica. Ele era um defensor da convivência com o semiárido e sempre
afirmava, em outras palavras, que o “maior erro do DENOCS foi ter criado ilhas
de água por todo o semiárido, mas não ter feito a sua distribuição horizontal
pelas adutoras”. Era bonito e emocionante vê-lo fazer longas ou curtas falas
não só com dados e números, mas com o coração, sabendo que por detrás deles
estavam seres humanos com seus rostos, carnes e ossos.
Nesse momento de estiagem se fala muita bobagem
sobre o semiárido, e são propostas novas loucuras, como a Transposição Baiana
do São Francisco, a custo inicial já orçado em cinco bilhões de reais. Que
incapacidade de aprender com os erros! O próprio governo baiano, para socorrer
200 mil pessoas na região de Guanambi, fez apressadamente a adutora do Algodão,
puxando água do São Francisco, resolvendo o problema da escassez urbana daquela
região. Portanto, sabem o que fazem. Quando querem, fazem bem. Quando fazem por
interesses escusos da indústria da seca, fazem mal.
O boi com sede bebe lama porque o sertão do
semiárido nunca foi lugar para criação de gado, exceto às margens do São
Francisco, hoje totalmente bloqueadas pelas cercas da propriedade privada. Foram
os europeus que trouxeram o animal para essa região, mas são eles que mais
sofrem e morrem em longas estiagens. Isso já é aprendizagem histórica.
Estamos longe da convivência adequada ao semiárido. Estupidez não falta.
Mas, Dr. Manoel Bonfim é um exemplo que os caminhos corretos são possíveis,
desde que haja honestidade intelectual e boa vontade.
Foto: Revista Mundo Jovem
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